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Por que me tornei musicoterapeuta?

Atualizado: 27 de jan. de 2020

Música e autoconhecimento: ao escutar nossos sons, descobrimos mais sobre nós. E esse foi um dos motivos que me levou a cursar Musicoterapia



– Musicoterapeuta? Mas por quê?!?


Um amigo jornalista havia me feito essa pergunta. A gente tinha se esbarrado na rua, e fazia um tempão que não nos víamos. Contentes pelo acaso que nos colocou no mesmo trajeto, começamos a indagar um do outro, pra tentar diminuir as saudades. E então falei que estava atendendo como musicoterapeuta.


– Tás com tempo livre? – perguntei, rindo do espanto dele – Vamos tomar um café que te conto…!


Sentamos num estabelecimento ali perto e ele se postou todo atento, esperando que eu falasse. Reconheci naqueles olhos genuinamente curiosos a minha própria vontade de escutar o outro, desde a época em que também trabalhava como jornalista. As ganas de saber mais sobre como cada pessoa dava conta dos desafios que surgem, e os medos, as dores e as alegrias que brotam a partir das escolhas por este ou aquele caminho.


E então relembrei.


Voltei a 2010, ano em que me vi com três empregos e mais dois trabalhos não-remunerados. Naquela época eu não percebia, mas hoje sei que, se dormia quatro horas por dia, era porque achava que, se estivesse descansada, sentiria que não estava me esforçando o suficiente. Que não estava dando o meu melhor. Vivia exausta, não tinha tempo pra contemplar um pôr do sol, nem quando estava no ônibus – já que nesses momentos eu desmaiava de sono, até mesmo em pé.


Ainda assim, eu tentava incluir a arte na minha produção jornalística, através de narrativas, fotos e formas poéticas. Eu precisava do lúdico, do que encantava a alma. Queria tomar os leitores pela mão e compartilhar com eles tudo aquilo que me havia me tocado, como quem diz “olha…! não é de enternecer? não é de fazer os olhos sorrirem…? ”


No final de 2012 a morte começou a rondar a nossa família. Estancamos. Paralisamos. E então buscamos respostas para aprender a conviver com a única certeza que se tem nessa vida. Fazer terapia foi o primeiro passo.


A partir da terapia, percebemos que era importante escutar, além dos outros, a nós mesmos. Começamos a nos abrir para experiências que se relacionassem com o autoconhecimento. Eu mesma sempre havia simpatizado com psicoterapia e outras práticas que incitassem o contato com a minha essência, mas de onde tirar tempo para dedicar a mim? era preciso trabalhar duro para contribuir com a construção do mundo que eu acreditava ser o ideal…


Quando conheci a Musicoterapia


Um ano depois, acompanhando meu marido numa reunião de trabalho enfadonha, durante um domingo chuvoso e frio, olhei pela janela do café onde estávamos, buscando uma distração daquela conversa que não me dizia muita coisa, e vi… um morro se erguia em meio às nuvens, o verde entre as gotas que caíam do céu… a natureza ali, tão simples e tão intensa… E ouvi… havia um casal se apresentando ao vivo – ele no violão e ela o acompanhando docemente com a voz. A música que trouxeram naquele momento esverdeado era Amor de Índio, que eu escutava na infância com meu pai, fã de Milton Nascimento.





Fui embalada pelos acordes, a letra, e então já não havia como esquecer aquele momento. Meu marido, que escutava atento a conversa de seus colegas, confessou-me depois que também se deixou levar pela música que envolvia o ambiente. Escolhemos voltar num outro dia para ouvi-los de novo, e quisemos nos aproximar, saber mais, conversar com aquela dupla. Descobrimos que ele era professor de música e começamos a fazer aulas.

Aos poucos, fomos percebendo que fazer música não era simplesmente fazer música.


Havia algo muito potente e sensível quando nos permitíamos estar ali, tocando, ouvindo, cantando, do jeito que conseguíamos. E não, não fazíamos nada de extraordinário, não éramos os “escolhidos”, os que detinham “o dom”. Aprender com alguém que também é musicoterapeuta foi fundamental, porque, diferentemente de muitos professores de música, ele não estava unicamente preocupado com a nossa evolução técnica, mas com o nosso encontro com nós mesmos a partir dos sons que trazíamos, fossem eles quais fossem.

Participei de um primeiro workshop para conhecer mais sobre Musicoterapia, e, ao final, compartilhei com o grupo: “não sei se a Musicoterapia está surgindo na minha vida para que eu seja apenas paciente ou para ser, eu mesma, uma musicoterapeuta”.


Reuni coragem e decidi seguir por essa direção, que fez muito sentido pra mim. Concluí a especialização em Musicoterapia, e continuo minha formação na área com aulas de música e cursos voltados a profissionais da Musicoterapia.



Ressignificar através da Musicoterapia


Não ensino música; faço sessões de Musicoterapia – em que não há uma maneira certa de tocar este ou aquele instrumento, e a desafinação nunca será vista como um erro. Me faço presença segura através do olhar, de palavras e, principalmente, da música para quem sente querer saber mais sobre si mesmo, para os que querem ressignificar sentimentos e escolhas, para quem precisa aliviar o stress ou enfrentar questões dolorosas, sempre de uma maneira mais leve e lúdica.


– Então, finalmente, respondendo a tua pergunta: me tornei musicoterapeuta porque, como dizia Carl Jung, sou uma curadora ferida.


Tenho minhas dores, e buscar alívio para elas me ensinou que posso auxiliar outras pessoas por esse caminho também. As dores e os medos que me trouxeram até aqui me fizeram valorizar os momentos em que fui acolhida, seja por pessoas generosas, seja pela própria música, e então desejo devolver esse acolhimento aos que encontro vida afora.



Vivência de Musicoterapia realizada no grupo de Terapia Menstrual facilitado por Julia Laitano, em outubro de 2017. A música é de autoria minha


O que é, pra mim, ser musicoterapeuta


Ser musicoterapeuta me faz uma pessoa melhor. Não em comparação aos outros, mas em relação a mim mesma, e me tornou uma buscadora – de sentidos, de sentimentos, de integrar partes esquecidas de mim mesma.


Sou musicoterapeuta porque sinto que a música me salva todos os dias. Que a arte nos convida a acreditar.


Sou musicoterapeuta porque isso significa fluir: continuar o tempo todo me transformando, a partir de novos olhares que me permito ter de mim mesma e também através dos processos que meus pacientes compartilham comigo, me ensinando ainda outras formas de soar.


Sou musicoterapeuta porque dar a mão para que meus pacientes encontrem sua essência através da música me faz (re)encontrar a minha própria essência.


Texto: Cláudia Schaun Reis

Foto: Maiara Sestari Bersch Edição: Liana Chiaradia – Guia da Alma



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